Em distrito onde se vive menos em SP, moradores reclamam da falta de equipamentos de saúde

OUTRO LADO: Prefeitura diz que foram realizados 32.551 procedimentos em julho na região e que realiza revisão constante do estoque de medicamentos

“Aqui é tudo muito difícil. Somos praticamente esquecidos pelos governantes”, conta a costureira Cenira Leite, 57, moradora no distrito Anhanguera, na zona noroeste de São Paulo. Localizado nos arredores da rodovia de mesmo nome, o distrito Anhanguera faz parte da subprefeitura de Perus e possui a menor idade média ao morrer, com 59 anos, valor abaixo da média geral da capital, que é de 71 anos.

No Itaim Bibi e no Jardim Paulista, na zona oeste, a expectativa de vida chega a 82 anos. O indicador está presente no Mapa da Desigualdade 2023, produzido pela Rede Nossa São Paulo, e está relacionado com qual idade as pessoas estão morrendo na cidade. É diferente de expectativa de vida, que faz uma projeção de agora para o futuro.

O dado não surpreende Cenira, que mora há mais de 30 anos no distrito e há sete no Jardim Rosinha. Para ela, o acesso a equipamentos de saúde é um dos grandes problemas enfrentados pelos moradores da região. “Lidamos com falta de médicos e muita espera no atendimento. Às vezes vamos à farmácia pegar medicamento e não tem”, conta.

A imagem mostra uma vista panorâmica de uma comunidade urbana, com várias casas e edifícios de diferentes tamanhos e cores. No fundo, há uma montanha coberta de vegetação. O céu está limpo e azul, e as ruas são visíveis entre as construções. Algumas casas são feitas de tijolos expostos, enquanto outras têm paredes pintadas. A cena transmite uma sensação de densidade populacional.

Moradora da Vila Sulina, Maria da Penha Souza, 58, reclama que além da demora na espera, os exames são agendados para outros pontos da cidade. Após passar por uma consulta na AMA/UBS Integrada Parque Anhanguera, ela teve uma eletroneuromiografia nos braços marcada para ser realizada no Tucuruvi, bairro na zona norte da cidade. “Perdi o horário e não consegui remarcar. Estou esperando para marcar com o médico da família para me dar o encaminhamento, mas nunca tem horário”, diz.

Desde 2016, Clarisvaldo Monteiro, 57, participa de conselhos de unidades básicas de saúde. Ele participou de uma manifestação contra a privatização da Sabesp onde levou um cartaz em que divulgava a situação do distrito. “Tinha lido sobre esse dado numa reportagem e foi colocado no cartaz. A intenção foi mostrar para todo mundo nossas reivindicações”, conta ele, que faz parte do Conselho do AMA/UBS Parque Anhanguera e do Conselho Municipal de Saúde.

Os moradores apontam que, devido à demanda, o território deveria ter uma UPA e construir uma UBS no Jardim Jaraguá, a fim de distribuir os atendimentos, um hospital maternidade que atenda as regiões de Anhanguera e Perus. “A AMA aqui atende a mesma quantidade de pessoas que a UPA de Perus. Se tivesse mais uma (UBS), já desafogaria a unidade do Morro Doce e das demais que já estão sobrecarregadas. O hospital que temos de referência é o de Taipas, que não consegue nem atender quem está no seu entorno”, diz Clarisvaldo.

O coordenador de relações institucionais da Rede Nossa São Paulo, Igor Pantoja, conta que o indicador é uma síntese do Mapa da Desigualdade que consolida, de forma negativa, as várias desigualdades presentes na cidade de São Paulo.

“Sempre os piores distritos em relação à idade média ao morrer são os que aparecem muitas vezes entre os piores indicadores em vários outros temas, por isso falamos em síntese. Se você tem uma renda menor, uma taxa menor de emprego, tem mais tempo de deslocamento de casa ao trabalho, acaba culminando nessa grande diferença”, explica Pantoja.

“Outra questão é que nas periferias da cidade há mais crianças e, em casos de morte, abaixa a média do bairro. No entanto, não é só o fenômeno demográfico que vai explicar totalmente uma diferença de mais de 20 anos entre quem mora nos Jardins e quem mora na Cidade Tiradentes ou Anhanguera”, complementa.

Integrante do Conselho Participativo Municipal Perus/Anhanguera, Joaniro Amancio, 55, comenta que, ao andar pela cidade, percebe as mudanças estruturais de uma região para outra. As reclamações sobre mobilidade urbana recaem sobre os ônibus que, segundo os moradores, demoram a passar e chegam lotados de passageiros. “Dependendo do local de moradia, é preciso pegar dois ônibus para ter acesso ao trem e metrô”, diz Amancio.

Para se locomover até a Lapa, por exemplo, Maria da Penha, moradora da Vila Sulina, diz que a média de deslocamento de ônibus e lotação é de 45 a 50 minutos se não tiver trânsito. Atenta às necessidades do bairro, Cenira conta que criou um abaixo-assinado com moradores do Jardim Rosinha e região e conseguiram ampliar o horário das linhas 1012-10 Monte Belo/Terminal Britânia e a 8010-41, Terminal Britânia, Jardim Paineiras.

Segundo a SPTrans, o distrito é atendido por 16 linhas que transportam em média 80 mil passageiros por dia útil. Aos domingos, a média é de 30 mil passageiros.

Moradora da comunidade Nova Esperança, no Morro Doce, desde 2018, Arlete de Souza, 45, reclama da falta de opções de cultura e lazer para crianças e jovens. “Não tem um lugar para ocupar a mente deles com atividades culturais. Quem tem condições leva seu filho para o lugar onde tem, quem não tem fica à espera do poder público, e eles não fazem”, reflete.

Mãe de três jovens adultos, conta que quando saiu de Jequitinhonha, no interior de Minas Gerais, seu filho mais velho tinha 19 anos e por lá aprendeu a tocar bateria e violão, tornando-se músico.

Ao chegar a São Paulo, viu que o acesso às oportunidades para seus filhos mais novos seria mais difícil. Ela ressalta o papel do poder público de auxiliar na educação e promoção de oportunidades. “Eu, como mãe, não tive condições de proporcionar, mas o poder público poderia auxiliar criando e disponibilizando esses espaços para inserir crianças e jovens e afastá-los de atividades perigosas”, conta.

O QUE DIZ A PREFEITURA DE SÃO PAULO
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, no território de Anhanguera/Perus há 1 Assistência Médica Ambulatorial (AMA) Especialidades, 1 AMA/Unidade Básica de Saúde (UBS) Integrada, 1 AMA 24 horas, 1 Centro Especializado em Reabilitação (CER), 1 Centro de Atenção Psicossocial (Caps) II Adulto, 1 Caps Infantojuvenil, 1 base do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), 1 Centro de Convivência e Cooperativa (Cecco), 1 Unidade de Pronto Atendimento (UPA), 1 Unidade de Vigilância em Saúde (Uvis) e 5 UBSs com Estratégia Saúde da Família (ESF), totalizando 32 equipes ESF, além de 3 equipes multiprofissionais e 3 equipes de atenção primária.

Por nota, a Prefeitura de São Paulo disse que foram realizados 32.551 procedimentos no distrito Anhanguera durante o mês de julho. No mesmo mês, disse que a UBS Rosinha realizou 7.981 procedimentos. “Para agendamentos em especialidades e exames, os pacientes são inseridos no Sistema Integrado de Gestão de Assistência (Siga) para encaminhamento. Diariamente, a unidade oferece vagas para atendimento clínico e pediátrico no acesso avançado. O tempo para atendimento no horário agendado da unidade é de 15 minutos”, afirma.

Questionada sobre a falta de medicamentos, informou que a unidade realiza revisão constante de estoque. Sobre a retirada e prescrição de medicamentos controlados, diz que os enfermeiros podem realizar prescrição dentro de protocolos específicos, no entanto, os medicamentos controlados não podem ser prescritos pela categoria e que a UBS Jardim Rosinha conta com profissionais farmacêuticos.

A prefeitura afirmou que os equipamentos de esporte estão nos distritos de Campo Limpo e do Capão Redondo. Cita o Centro Esportivo Campo Limpo e 15 Clubes da Comunidade (CDCs). “Na subprefeitura de Perus há 5 equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura em funcionamento: a Casa de Cultura Hip Hop Noroeste (Casa do Hip Hop Perus); os CEU Perus, que engloba o Circuito SPCine, o CEU Parque Anhanguera e a Biblioteca Municipal Padre José de Anchieta, que têm telecentros, e o Bosque de leitura Parque Anhanguera. No momento, não há planos de inauguração de novos equipamentos na região”, finaliza.

*Reportagem publicada em parceria com o jornal Folha de S.Paulo.