
Apesar de políticas de gratuidade, candidatos e professores pedem mais informação e apoio
O sonho de cursar a universidade pública no Brasil esbarra muitas vezes na porta de entrada do vestibular: o pagamento da taxa de inscrição. O valor do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) tem se mantido em R$ 85 nos últimos anos. Já estudantes que desejam ingressar na USP precisam pagar R$ 211 para fazer a prova da Fuvest. Na Unicamp, a inscrição, que começou na sexta (1º), custa R$ 221.
Todas essas seleções oferecem isenção e redução da taxa para parte dos candidatos. Neste ano, por exemplo, 63% das 4,8 milhões inscrições confirmadas no Enem foram gratuitas. São alunos que estão matriculados no último ano do ensino médio em escola pública, recebem bolsa integral em escolas particulares ou se enquadram em situação de vulnerabilidade socioeconômica e estão cadastrados no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais). Participantes do programa Pé-de-Meia, do Ministério da Educação, também são beneficiados.
No entanto, para candidatos de baixa renda que desejam testar seus conhecimentos em vários formatos de avaliação ou apostar em mais de um vestibular, é necessário equilibrar as contas com itens básicos da rotina, como transporte, alimentação e cursos preparatórios.
“Ao escolher entre fazer uma compra de mercado ou fazer a inscrição para o vestibular, a pessoa irá escolher sobreviver”, comenta Gabriela Lima Vieira, orientadora do cursinho popular Maria Firmina dos Reis, localizado no bairro de Cidade Ademar, na zona sul de São Paulo.
A partir de sua experiência como professora do ensino médio de rede pública, ela afirma que as taxas “acabam sendo uma barreira para o acesso ao vestibular”.
Estudantes que não conseguem a isenção da taxa de inscrição precisam se organizar financeiramente para conseguir fazer as provas. “Eu juntei o dinheiro que recebia o Pé-de-Meia, então fui guardando para conseguir pagar a taxa”, afirma Helly da Silva, 18, estudante do cursinho popular São Mateus em Movimento, na zona leste de São Paulo. Atualmente o benefício paga cerca de R$ 200 ao mês.
Mas o problema vai além do custo das provas. Questões como documentação, extratos bancários, falta de acesso a internet e desconhecimento da dinâmica do processo podem tornar o acesso de pessoas que moram na periferia ainda mais complicado.
“O estudante sabe que precisa fazer, porém não sabe como. A gente pode iluminar esse caminho”, afirma Nadine de Souza, ex-aluna e atualmente coordenadora do polo Santos Mártires do cursinho Rede Ubuntu.
Moradora do Jardim Ângela, no extremo sul da cidade, Klara Portela, 18, conta que fez cinco vestibulares em 2024 e não conseguiu isenção do pagamento apenas para a Fuvest, pois o comprovante de renda da sua mãe, que trabalha como diarista, não foi aceito pela instituição.
“Se dependesse de mim, eu não faria a prova, mas devido às parcerias do cursinho, eles conseguiram fazer o pagamento no último dia de inscrição”, conta a estudante da Rede Ubuntu.
Para Bruna Waitman, CEO do Instituto Sol, que trabalha para auxiliar jovens da periferia a ingressar no ensino superior através da qualificação educacional, é necessário tornar o vestibular um processo mais simples e acessível. “A falta de informação, especialmente nos pedidos de isenção, acaba afastando principalmente os jovens mais vulneráveis. A solução passa por tornar esse processo mais simples, com linguagem acessível e canais de apoio ativos no período das inscrições”, afirma.
Na segunda-feira (4), a Fuvest divulga o resultado dos pedidos de isenção para o vestibular 2026. A comissão responsável pelo vestibular da USP afirma que tem tornado o processo de solicitação de isenção ou redução da taxa de inscrição menos burocrático nos últimos anos.
“Antigamente, para conseguir a isenção ou redução, era preciso juntar uma grande quantidade de documentos atualizados. Agora o processo ficou muito mais simples, com a exigência de menos documentos. É possível comprovar isso comparando os Guias de Inclusão anteriores com o atual”, diz o órgão em nota, destacando que o período para a solicitação durou dois meses —teve início em 12 de maio e terminou em 11 de julho. As inscrições para a prova começam em 18 de agosto.
“Nas nossas comunicações, sempre alertamos os estudantes para não deixarem a solicitação para a última hora, justamente para reunir a documentação com calma e realizar o processo todo com atenção”, afirma.
*Reportagem publicada em parceria com o jornal Folha de S.Paulo.