O slogan da Associação das Mulheres de Paraisópolis (AMP), “Nenhuma mulher ficará para trás!”, diz muito sobre sororidade. A palavra, que eu conheci a pouco tempo, mas a ação eu já via há alguns anos acontecendo na prática. Durante esses 10 anos atuando em Paraisópolis e três na instituição do G10 Favelas, como diretora de uma das iniciativas, a Cria Brasil, presenciei e fiz parte de uma rede de mulheres extremamente fortes que transformaram a vida de milhares de outras mulheres. Observei o nascimento de projetos que foram desenhados para mudar realidades de dor e violência e que hoje são negócios de sucesso e alcançam ainda mais histórias. Todos eles, liderados e gerenciados por mulheres.
O Emprega Comunidades, por exemplo, uma iniciativa que tem como objetivo capacitar e empregar moradores de favelas, nasceu especialmente para as mulheres, com o desejo de proporcionar uma alternativa para aquelas que eram violadas e violentadas todos os dias. Com esse mesmo propósito, outros projetos foram desenvolvidos e apoiados pelo G10 Favelas, como o Mãos de Maria, Costurando Sonhos, o G10 Bank e o Sacoleiras Vendem Tudo. Na atuação nas favelas do Brasil, o grupo percebeu que as mulheres são o coração da maioria das famílias, pois são elas que cuidam, que geram e que, na maioria das vezes, levam alimento para dentro de casa. Provando essa observação, o IBGE mostrou que quase metade das casas brasileiras, são chefiadas por mulheres.
Desse modo, é inegável o tamanho da força feminina e do seu poder de transformação. Porém, o que é difícil de discordar também, é que essas mesmas mulheres, que chefiam casas, empresas e suas próprias vidas, ainda precisam de uma validação masculina para serem efetivamente respeitadas e validadas. Infelizmente, ainda existe muita violência, machismo e misoginia. Parece até mentira, mas as mulheres ainda precisam gritar para que tenham sua voz escutada, e muitas vezes, nem assim conseguem. A união feminina e a rede de apoio são essenciais para potencializar essa força e para que todas possam ter suas vidas validadas.
É um ciclo. Para que as mulheres de Paraisópolis tivessem acesso a capacitação e a possibilidade de viver em liberdade com sua própria renda, mulheres como Sueli Feio, Maria Nilde, Elizandra Cerqueira, Juliana Oliveira, Rejane Santos, Flávia Rodrigues, e Jaqueline Amorim tiveram que dar as suas caras pela causa e fazer acontecer, juntas a outras lideranças que iniciaram esse trabalho lá atrás, elas têm aberto caminhos para que outras mulheres possam dar continuidade a esta rede de apoio não somente em Paraisópolis, onde surgiu há alguns anos, como também em outras comunidades no Brasil.
Por meio do G10 Favelas, essas lideranças têm se conectado e trocado ideias, compartilhando suas dores, suas experiências, seus cases de sucesso para potencializar outras lideranças femininas nas comunidades no Pará, Maranhão, Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Minas Gerais, entre outras. Elas têm discutido o papel da mulher periférica na sociedade e também levado informação para aquelas que não sabiam nem sequer em qual direção seguir.
Elas criaram soluções para libertar as mulheres por meio da gastronomia, da moda, da comunicação, do crédito bancário, formações e conhecimento para que andem lado a lado e não deixem nenhuma mulher para trás.
Eu como mulher periférica, preta, nordestina, filha de uma cearense, faço parte dessa rede. Uma cadeia, onde cada envolvida é de extrema importância. Também tenho certeza que a dona Bárbara, que mesmo passando tantas dificuldades teve força e contou com uma rede de apoio para sair de um quadro de violência doméstica. A sororidade foi importante para salvar a vida da minha mãe e tantas outras mulheres que vieram antes de mim e delas. Eu sei que ainda existe uma longa caminhada para avançarmos na sociedade, mas sei também que iremos chegar juntas